quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Jogam-se búzios

Era uma tarde ensolarada. Mariana e Cecília passeavam por uma praia contando suas histórias e amores. Eram amigas de longa data, tanto que compartilharam chocalhos. Foram passar as férias juntas em Angra dos Reis e Cecília falava sobre seu novo namorado: homem de família, trabalhador, alto, moreno, bonito, o desejo de qualquer mulher. Mariana escutava paciente e feliz com uma felicidade fraternal.
Enquanto as duas passavam por mais um desses muros rabiscados e cheios de papéis colados avistaram um cartaz amarelado, meio envelhecido pela chuva e pela maresia e que dizia: “Jogam-se Búzios”. A maneira que estava escrita impressionou Cecília. Ela acreditou que talvez a pessoa tivesse algum conhecimento e que fosse ao menos sensata. Mariana logo deu a ideia:
- Não custa pelo menos conhecer. Uma consulta só não mata.
Cecília ainda estava intrigada com o cartaz tão corretamente escrito. Aceitou ir conhecer a tal “Mãe Lucrécia”. O endereço estava no canto inferior da folha meio apagado, mas ainda era discernível. Era em uma rua próxima, então subiram a estradinha da praia de onde se avistava a ilha da igreja.
O sol estava cada vez mais forte e mais próximo do meio dia. Uma brisa salgada batia no rosto e deixava as amigas com aquela sensação pegajosa, mas gostosa, que o vento marinho causa na pele. Cecília seguia pensando agora no que mãe Lucrécia diria sobre seu futuro: se casaria com seu namorado Marcos, se teria filhos com ele, se teria uma vida confortável. Eram tantos “se” que nem reparou no caminho. Andava apenas com a noção de estar próxima a Mariana e foi seguindo-a distraída, quando se deu conta estava na frente da casa do endereço. Na frente havia a mesma frase do cartaz: “Jogam-se búzios”.
A casa era meio antiga, uma mistura de madeira e alvenaria bem gastas. O lugar tinha um jeito esquisito, como se muitos segredos estivessem escondidos por detrás das tábuas de madeira e sob o chão de terra compactada. A porta estava aberta, quase escancarada, como se as convidasse a entrar. Havia um grande corredor, iluminado apenas por poucos raios de sol que atravessavam as janelas velhas e opacas. No fim do corredor um cômodo se abria não muito grande, mas suficiente para uma mesa simples de madeira com uma toalha vermelha e azul estendida sobre ela. Uma cortina carmim deixava toda a sala à meia luz. Num sofá preto desgastado um gato marrom se espreguiçava com olhos avermelhados e atentos.
Em outro canto da sala havia uma mulher alta e grandalhona, com olhos pretos e marcados com muita maquiagem. Seus cabelos pendiam em ondulações bagunçadas e disformes pelos ombros até quase seu cotovelo, usava um vestido que um dia talvez tenha sido de um amarelo vibrante, mas de alguma forma a cor parecia ter desbotado quase toda. Quando perguntou o que queriam a voz parecia quase profética. Era uma mulher estranha. Era Lúcrecia.
Cecília parecia indiferente ao clima do lugar. Isso afetava mais Mariana que estava assustada.
- Vi um cartaz na rua, vim saber meu futuro.
Ela parecia determinada e totalmente alienada ao. A outra permaneceu calada atenta ao gato marrom, às vezes disfarçava olhando objetos esotéricos aleatórios. A mulher misteriosa não disse mais nada. Sentou em sua cadeira, pegou seus búzios, jogou sobre a mesa e os analisou. O barulho das conchinhas batendo sobre a madeira assustou Mariana se encolheu como se quisesse manter o silêncio. Cecília olhava atenta querendo ver ali as respostas de sua vida. Lucrécia apenas observou enigmática e silenciosa  as conchas por alguns segundos, levantou a cabeça e olhou diretamente nos olhos de Cecília:
- Vejo aqui que você irá se apaixonar.
- Eu já estou apaixonada senhora.
- Eu não estou falando do presente, estou falando do seu futuro. É um homem de cabelos claros, olhos verdes, de estatura média...
- Mas esse não é...
Lucrécia parou e olhou rapidamente para a menina com ar de quem não gostava de ser interrompida. Parecia estar contando até dez antes de voltar a falar e olhava fixamente para o gato marrom no sofá preto logo atrás de Cecília. Após o momento de silêncio ela voltou a falar com uma voz muito grave:
- Você se casará com esse homem e será muito feliz. Vocês terão dois filhos e ele ganhará muito dinheiro. Você morará em um lugar alto e com uma vista bonita. É tudo o que eu tenho a te dizer.
Cecília permaneceu quieta por alguns minutos, estava digerindo a informação. Então não era Marcos o homem que estava em seu destino e isso a deixou angustiada. Lucrécia levantou da cadeira em um movimento firme e com um gesto mandou que Cecília fizesse o mesmo. A mulher perguntou a Mariana se ela também consultaria os búzios e a menina balançou a cabeça negativamente. Pagaram os serviços e voltaram para casa. No caminho as meninas não disseram nada. Mariana ainda estava muito assustada e Cecília muito pensativa.
No dia seguinte as duas voltaram para suas casas no Rio de Janeiro no bairro da Tijuca. Cecília tinha o hábito de correr na pista próxima ao Maracanã. Estava correndo quando de um modo inesperado um galho de uma das árvores partiu e caiu bem na sua frente, o que a fez tropeçar. Logo atrás vinha um homem loiro, de estatura média, olhos verdes e bonitos correndo. Ele parou para ajudá-la. Ela sentiu que aquilo era um sinal místico de sua profecia. Ele pareceu interessado pela menina que logo lhe passou seu número de celular. Ele a deixou em casa e assim que foi possível ela correu para o telefone e ligou para Marcos, seu namorado. Pediu que ele viesse vê-la, pois não podia terminar o namoro pelo telefone. E assim o fez logo que ele sentou no sofá cinza de seu apartamento. Explicou que o amor tinha acabado e que a relação deles não iria longe de qualquer maneira, mas no fundo Cecília sentia uma dorzinha no peito (ela amava Marcos).
A menina começou a sair com Luiz (o corredor do maracanã) e seis meses depois já estavam casados. Tudo parecia estar acontecendo como Lucrécia disse que seria até que Luiz, que trabalhava como investidor, perdeu tudo em uma crise financeira. Eles foram morar no Vidigal, em dos pontos mais altos . A vista de lá era muito bonita, o problema era subir a ladeira. Luiz morreu vítima de uma bala perdida durante um tiroteio entre traficantes e policiais, deixando Cecília com três filhos órfãos de pai e com o quarto ainda na barriga. A vida ficou complicada, mas Cecília conseguiu criar os filhos trabalhando em casas de famílias abastadas da zona sul. Ela nunca mais se casou.
Marcos ficou chateado com o fim repentino do namoro com Cecília e buscou apoio em uma amizade com Mariana que acabou se afastando da amiga depois que ela se casou com Luiz. Os dois descobriram um tipo de afeto mais profundo e começaram a namorar. Entre amizade, namoro, noivado e casamento foram dois anos. Eles são muito felizes e tiveram um filho. Marcos ajudou sua empresa a passar sem prejuízos pela crise e foi promovido ao cargo de vice-presidente. Ele e Mariana moram na Barra da Tijuca de frente para o mar e estão planejando agora o nascimento do segundo filho. Cecília ainda possui uma bela vista para o mar.

(Stella Araujo)

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Querida Magnólia

Da janela eu via uma mulher.
Dona Magnólia, como costumei chamar.
Come sopa de colher
Por que não tem mais do que se alimentar.
Sorri um sorriso sem estrelas
Quando me passar pela calçada,
Mas ainda mostra um luzir de felicidade
por finalmente ser notada.
Tem cara de mãe,
Mas é sem filhos.
De certo é filha,
Mas não tem mãe.
Vive só sob a marquise da avenida
Pedindo somente um pão.
Ontem choveu muito.
Escutei o tossir de Magnólia.
Chorei pensando nela
E escrevi sua história.
Uma página apenas,
Escrevi o que sabia.
Ela não era ninguém
Para o povo que ali vivia.
De manhã havia um saco preto na rua.
Um grande pacote fúnebre.
E a única coisa que consegui pensar foi:
Por favor, que não seja a querida Magnólia.

(Stella Araujo)

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Processos de formação

Fui desamada.
Como isso pode ser antemaginado?
Depois de tanto amor abnegado,
Um amor tão justaposto.
Mas esse amorismo doente
Só comprova a patologia de minha mente.
Sempre fui amorista.
Que profissão terei agora?
Sempre dependi de derivações...
Prefixos e sufixações.
Hoje sou primitiva radical.
Para ser feliz
Não dependo de morfemas.
Ninguém além de mim.

(Stella Araujo)

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Esperanças

Ismália, volte já para cá!
Esses teus sonhos e loucuras
Jamais vão se concretizar.
Volte à terra que é teu lugar.
Jamais houve humano
Que sem asas soubesse voar.
Saia de tua torre que te prende.
Tire do alto da janela
Teu corpo que pende.
Nenhum sonho é da gente.
Ponha no chão teus pés
E nunca mais se tente.
Esqueça teus desvarios
Antes da última entente.
A lua não te aceita,
o mar não te entende.
Lembre-se do que você semeia
E tire já os pés da areia.
Não se perca nas ondas,
Nem na voz da sereia.
Não desista da peleia.
Não siga com os olhos
Esse moinho que devagueia,
Pois ele vai empurrando
Essa tua boca cheia.
O mundo gira por si só todo tempo.
Não há nada que você possa fazer
para seu próprio salvamento.
A loucura te toma,
meu choro me destrói.
Lá se foi mais uma
Para o céu de todos nós.

(Stella Araujo)

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Ruas que passam

Hoje eu andei por essa rua que já foi minha,
Onde ladrilhei todas minhas histórias de                                                                        [infância.
Pedrinhas de brilhante que cintilam apenas                                                            [na memória
E pelo asfalto que corri quando criança.
Nessa rua tem uma dormideira
que bocejando me cumprimentou.
Meu toque a fez voltar a dormir
E com um novo sonho me deixou.
Daqui cem anos volto para acordá-la.
Não sei que novas esperanças terei até lá.
Lembrei do monte que avistava dali
Quando tantas vezes em solidão me                                                                          [encontrava.
Sentei na calçada de cimento
Onde me machuquei e lamentava.
Dona Maria ainda mora aqui,
Olhou-me curiosa enquanto eu passava.
O sol ainda é o mesmo,
A casa não mudou,
Mas há algo diferente,
algo que não se inteirou.
Sinto no peito o deslocamento
que a distância proporcionou.
O que era saudade agora já acabou...
Já não é mais a minha rua essa que passou.

(Stella Araujo)

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Locomotivas pelo mar

Diz o que tem pra me dizer,
Mas por favor diz rapidinho
Que o tempo é passarinho
E é difícil de ceder.
Diz o que tem pra me dizer,
Pois o trem já vem zumbindo,
E eu aqui nesse nimbo
Não sei mais o que fazer.
Diz o que te atormenta
Que eu não vou esquecer.
Talvez o que te tenta
Venha de mim tentar você.
Diga logo que o apito grita
E o sino salpica adeus pelo ar.
Nada disso fica
Só as palavras bonitas
Que espero você contar.
Agora o trem já se achega
E você nem para chegar.
Venha que sem tua imagem
O vazio será a última desse lugar.
Não posso refletir teus olhos
Por que você não vai chegar.
O tempo que já passou
Para ninguém retornará.
Agora já é tarde para lamentar.
O trem já está partindo,
Se preparando para zarpar.
Navegará pelas águas do choro
De quem você provou não amar.


(Stella Araujo)

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Lembranças

Fotografias caem do céu,
Como uma tempestade de lembranças.
Flashes rápidos de uma vida inteira,
Desde meus tempos de criança.
Impressões de apenas mais uma passageira
Desse mundo que gira e não descansa.
E que escreve novos versos no infinito
Como música para uma dança.
Versos e fotos de uma peça que está durando toda uma vida.
Uma atriz de dramas, comédias e ação,
Mas comedida.
A Chuva cai e escorre por meu coração
Esse é feito de porcela, frio e sem expressão.
A chuva cai e bate nesse solo que parecia tão seco.
A chuva entra pelos poros desse rosto de areia e gelo.
A chuva fez nascer rosas desse solo podre de esterco.
A chuva faz nascer da semente um mundo inteiro.

(Stella Araujo)

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Reflexão sobre o Eu



Antes eu via o espelho.
Um que ficava no fim do corredor.
Com apenas um olhar ele dizia tudo.
Mas agora tudo que eu vejo
é uma parede branca.
Eu olho pra ela,
mas ela não olha pra mim.
Onde eu estou?
Onde está aquela menina que sorria pra mim?

(Stella Araujo)

...Você

O fel que amargou teus lábios
é deletério para o meu coração.
Palavras ditas, soltas e sem razão,
buscam agora o meu perdão.
Não digo que foi ruim,
nenhuma palavra pode descrever um fim.
No fim das contas os fins não existem.
E no fim de uma promessa
restam os recomeços.
Sonhos simples e modestos,
buscam nessa sesta
a volta do que ,nesse ínterim,
é mais importante para mim...

(Stella Araujo)

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Suplício de Tântala

Tão perto dessa fruta rosa,
mel dessa árvore frondosa,
sobre o ramo mais alto disposta
afastada pelo vento que vem da costa
desse imenso mar de rocha.
O vento sopra frio sobre a tímida moça
que nas rochas de teu coração repousa
da maldição da saciação amorosa.
É Tântala ainda disposta
que busca valente, mas não alcança
a personificação de seu sonho de criança.
A deusa deu teu coração a outra.
Deixou-lhe no suplício de quem busca e não                                                                   [alcança.
O meu foi posto na elísia tristeza
entre o paraíso do submundo e a certeza
de que mesmo com dedicação e destreza
sofrerei da fome de maior grandeza.

(Stella Araujo)

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Partícula atrativa

Se ele Não me ama
acabou a flexibilidade.
O Não me puxa,
O Não me atrai.
Que grande apelo
tem o Não sobre mim!
Se Quando me ama
corro atrás do tempo,
mas perco as escolhas.
O Quando me define.
Que grande apelo
Tem o tempo sobre mim!
Não estamos no fim
muito menos no começo.
Sou pronome pessoalmente teu.
Você foi conjugado para mim
na primeira pessoa
de teu singular modo de ser,
Mas que grande apelo
tem você sobre mim!

(Stella Araujo)

sábado, 25 de setembro de 2010

Recomeçar


O mundo gira e a vida passa.
Tudo a flor de minha pele.
Tudo arrancando minhas pétalas.
Tudo murchando meu corpo.
Tudo me trazendo para algo novo.
Pequenos erros cortando a pele,
desfazendo as proteínas.
Reconstruindo pelos aminoácidos
minha nova vida.

(Stella Araujo)

Osmose


Transpirando palavras,
excretando sentimentos.
Calafrios pela pele
pelo que está aqui dentro.
Não por não servir.
Não por querer esquecer.
Mas meu corpo precisa
de um equilíbrio osmótico.
Por isso vou escrever.

(Stella Araujo)

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

300 Centésimos


Surgi contando os meses,
cresci riscando os dias,
morrerei me prendendo às horas.
Os anos não passam,
tudo acontece em três segundos:
em um nasci,
em dois cresci,
em três...

(Stella Araujo)

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Sopro de saudade



Assim
assoprou
sossegado
e sem pensar.
Cismava na saudade
que o vento assobiou canções.
Sibilaram-se também as memórias
que o querido vento assobiador trazia.
Silêncio e suspiros calados sobem pelos sapatos
sucumbindo e salpicando pela face escura da noite.
Mas agora o girassol já se curvou ao sol trazendo a tarde.
Digo adeus ao que o vento levou e às memórias de saudade.

(Stella Araujo)

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Macetes do amor


Se a fórmula do amor
for tão complicada 
quanto as de matemática
amarei por regra de três
e seja o que Deus quiser

(Ella Maria)

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Para Cecília Meireles


Podo-me
tentando
voltar mais forte,
mas as folhas
não crescem,
as flores
não brotam
e os frutos
atrofiam.

(Stella Araujo)

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Dualidade


Sou duas pessoas:
uma que pensa
e uma que sente.
A que sente escreve,
a que pensa vive.

(Stella Araujo)

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Lembraças


Passo como o pássaro
passa num rasante
pelo espaço
por onde já passei,
mas sem pensar
em pousar
os pés no chão.


(Stella Araujo)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Fluxo de pensamento amoroso


Se bem me quer
E eu não querer
Não é amor.
Se mal me quer
E eu querer
Só resta a dor...
Mas não é amor!
Amor é par
Sofrer é ímpar.
Quem ama não sofre,
Só sofre quem acha que ama
Então,
Mal me quer o amor!

(Stella Araujo)

sábado, 10 de julho de 2010

Olhar consciente

Esses olhos que observam minha alma
Noite adentro até em sonhos,
Refugiam-se nos meus pensamentos
Em breves momentos
Onde penso em quem sou.
Esses olhos que me conhecem,
Que perscrutam segredos
Que nem eu mesma conheço.
Que vêem meu rosto,
Como muito mais
Que carne e osso,
Como janela do meu sentimento,
Onde a chuva é choro
Que desce calmo como no vidro
Até atingir o chão.
Eles olham para minha face,
Espelho límpido de emoção,
E me contam em segredo,
Daqueles ao pé do ouvido,
As minhas dúvidas entre o sim e o não.
Esses olhos que são
E não são meus,
São a minha consciência
Metamorfoseada nesses olhos
Que me observam sem perdão.

(Stella Araujo)

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Pedras no caminho


Andando pela rua
Sem a menor atenção
E com os pés caminhando
Sem comando ou razão.
Pessoas, carros, árvores...
Tudo passa e eu não percebo.
Como um zumbi, ando pelas ruas desta cidade...
Sem sentimento algum e com a mente vazia
Subo as ruas e desço as avenidas.
Mas o destino se incumbe dos que esqueceram da vida
E vivem em uma permanente e maçante rotina.
De lá para cá, de cá para lá...
Todo dia, na mesma hora, no mesmo lugar
A mesma expressão de quem não está lá.
Uma topada numa pedra muda o costume.
Percebo as pessoas, os carros, as árvores.
Saí da rotina e para isso só precisei de uma pedra.
Se fosse uma flor eu nem a teria percebido.
Pode até ser mais bonita,
Mas para que serve essa beleza hoje em dia?
Os infortúnios são os que nos acordam
Desse marasmo que tem sido a vida.
No dia seguinte a mesma apatia.
O efeito da pedra era passageiro
Como as promessas de ano novo
que eu fiz um dia.
Em meu caminho comum,
Piso em uma flor... Nem vejo.
Continuo meu caminho...
De lá para cá, de cá para lá...
Mas as pedras no caminho irão me acordar.
(Stella Araujo)

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Cidade Maquete



Hoje sonhei que morava em uma maquete.
Oh! que grande pesadelo!
Mas nela não existiam:
Ruas,
Esquinas,
Nem colinas.
Por todo lado só se via:
Quadras,
Blocos,
E o planalto.
Sonhei que dois grandes discos voadores 
Invadiram a cidade!
Grandes,
Brancos,
E de concreto.
Discos voadores com duas torres por perto!
Dele desceram centenas de engravatados.
Todos com:
Pastas,
Documentos,
E licitações.
Por fora pareciam homens.
Falavam como homens,
Andavam como homens,
E roubavam como os homens,
Mas por dentro não passavam de ilusões.
Corri para o outro lado.
Desci um grande eixo 
Que atravessava a maquete.
Comecei a olhar para os lados
E perceber que era tudo copiado:
Prédios iguais,
Jardins iguais,
Pessoas iguais.
AH! Acordei...
E foi então que notei
Que não sonhei.
Era tudo verdade.
Estou em Brasília,
A cidade da minha realidade.

(Stella Araujo)

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Intransitivo



Amar é simplesmente amar.
Quem ama... ama e só.
Como é tola a gramática ao constatar
Que amar é verbo transitivo direito!
Por que complementar o que já é o complemento?
Amar já congrega todo o sentimento.
Cuidado amante com a definição de amor!
Cabe-me explicar
Que amar é como as poesias.
Simplesmente indefiníveis
E não se entrega a quem as tenta definir.
Porque se quer amar
Não procure razões.
Amar é muito mais do que corações,
Mais do que o que se pode ler num verbete.
Simplesmente ame!
Não espere motivos de quem diz que te ama,
Pois essa pessoa nasceu com as regras gramaticais
Dentro do coração.
Quem ama, ama sobre as regras de um
Tempo,
Modo
E pessoa
Mas desconhece a explicação.

(Stella Araujo)

terça-feira, 25 de maio de 2010

Maria está exilada


Minha terra tem coqueiros,
Onde bate o salgado vento do mar.
Os lagos que aqui existem
Não se comparam às praias de lá.

Nossa cidade tem mais açúcar.
Nosso calçadão mais quiosques.
Nossos cariocas mais vida.
Nosso cristo mais turistas.

Sozinha ressecando à noite,
Mais umidade encontro lá.
Minha terra tem coqueiros,
Onde bate o salgado vento do mar.

Minha terra tem praias,
Que não existem por aqui.
Sozinha ressecando à noite,
Mais umidade encontro lá.
Minha terra tem coqueiros,
Onde bate o salgado vento do mar.

Não permita Deus que eu fique
Sem pelo menos ter passado no vestibular.
Sem que eu faça meu curso de direito.
Um dia ainda ei de passar no concurso público
E então voltarei para minha terra
onde nos coqueiros bate o salgado vento do mar.

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Pois é gente,
Minha primeira postagem.